sexta-feira, 23 de junho de 2017

 

A radiografia da saúde básica

 

Clique aqui e veja o documento com 125 páginas

Segue link para quem quiser acompanhar o primeiro dos quatro volumes com o mapeamento que estamos fazendo nas Unidades Básicas de Saúde de Jundiaí. Nesta etapa inicial, o material analisa dez postos de saúde da Regional 3: Caxambu, Colônia, Ivoturucaia, Jundiaí Mirim, Rio Acima, Rui Barbosa, São Camilo, Tamoio, Tarumã e Vila Aparecida.

O documento, por exemplo, aponta a necessidade urgente de se implantar prontuários eletrônicos, projeto que a Plataforma de Gestão de Saúde planeja colocar em prática no próximo ano,. Ou de se expandir os serviços de PSF (Programa de Saúde da Família) a todas UBSs.

Durante quase três meses, conversamos com gerentes e usuários destas dez unidades para avaliar os problemas existentes. O mapeamento completo, com as 37 Unidades Básicas de Saúde, deverá estar pronto até o fim do ano.

Sem data marcada, nosso time aplicou uma entrevista com 14 perguntas a 297 pacientes destas UBSs, com questões sobre a qualidade do atendimento, desde recepção ao médico e odontológico, tempo de espera para consultas, higiene e outros.

O documento mostra que cada unidade encontrou soluções próprias, muitas em conjunto com a sua comunidade, para melhorar o atendimento e que podem ser usadas em toda a rede.

O objetivo deste mapeamento não é o de fazer uma caça às bruxas, mas sim agregar valor ao município. Pois melhorando o cuidado primário com a saúde vamos conseguir desafogar os hospitais, além de dar mais qualidade de vida das pessoas.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

 

Terra à vista

O país segue a deriva. Com a nau sem rumo, tenta o sisudo timoneiro, dotado de estoicismo duvidoso, dar-lhe curso a um norte seguro. O momento é difícil. Uma tormenta inesperada tornou o que era luz radiante em céu escuro com clarões assustadores. Com ondas altas as águas torvelinham cada vez mais e o ranger rude da embarcação envelhecida parece prestes a naufragar.  Os marinheiros, não afetos a este tipo de mar revolto, alvoroçados ameaçam saltar do barco. Abandonar ao Deus dará o comandante que sorria até a pouco. Sentem – e como sentem – a falta do grande capitão, que como se refém de Netuno fosse, submergiu às profundezas do oceano e deu-se o direito ao silêncio. Sem comando efetivo, gritos e ordens de afogadilho é o que mais se ouve no convés. Da proa à popa ninguém se entende. Como esta viagem terminará ora é uma preocupante incógnita.

Em meio à tempestade, eu, como o bom Popeye, velho marujo de muitas empreitadas, me resigno a fazer o papel que sempre me coube em momentos de borrascas: continuar a exercer minhas funções com afinco, honestidade e dedicação sem olhar para o lado. Concentrar-se na missão e não fugir aos princípios básicos do comportamento ponteado pela retidão, mesmo diante de enormes dificuldades, pois somente o empenho compromissado de quem almeja chegar a terra firme dará sentido a viagem.

Sinto-me um cartógrafo a redesenhar em ritmo febril mapas em busca de alternativas. Na pequena mesa, com o lápis, e compasso na mão, é difícil manter o equilíbrio à mercê do balançar tresloucado da embarcação. De súbito, cai-me ao colo um livro, despencado lá do alto da empenada prateleira. Mesmo com a pouca luminosidade que a chama do toco de vela a minha frente proporciona, consigo folhear e ler boa parte do conteúdo. A leitura vem a calhar, pois é atual, apesar de ter sido editada em 2007. Um livro publicado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) com uma coletânea de cem redações de universitários brasileiros selecionadas no ano de 2006 em meio a um total de 41.329 inscrições recebidas. O tema proposto pela UNESCO que deu título a publicação foi “‘Como vencer a pobreza e a desigualdade’. As escritas são ótimas e, para orgulho da terra, um jundiaiense consta na lista a pagina 214. Porém a redação que chamou a atenção foi a da carioca Clarice Zeitel Vianna Silva, acadêmica à época da Faculdade de Direito da UFRJ, pela contundência, malícia e posicionamento juvenil lúcido, num momento onde muito se questionava a abstração dos jovens brasileiros. Apesar de abusar de oximoros – eu adoro! – que é o combinar de palavras contraditórias para reforçar uma ideia, e ter sofrido diversas críticas de vários ‘iluminados’ detentores do domínio da Língua Portuguesa, considero o texto irrepreensível. Intitula-se  ‘ Pátria Madrasta Vil’ e diz:

“Onde já se viu tanto excesso de falta? Abundância de inexistência… Exagero de escassez… Contraditórios? Então aí está! O novo nome do nosso país! Não pode haver sinônimo melhor para Brasil.

Porque o Brasil nada mais é do que o excesso de falta de caráter, a abundância de inexistência de solidariedade, o exagero de escassez de responsabilidade.O Brasil nada mais é do que uma combinação mal engendrada – e friamente sistematizada – de contradições.
Há quem diga que ‘dos filhos deste solo és mãe gentil.’, mas eu digo que não é gentil e, muito menos, mãe. Pela definição que eu conheço de mãe, o Brasil está mais para madrasta vil.

A minha mãe não ‘tapa o sol com a peneira’. Não me daria, por exemplo, um lugar na universidade sem ter-me dado uma bela formação básica. E mesmo há 200 anos não me aboliria da escravidão se soubesse que me restaria a liberdade apenas para morrer de fome. Porque a minha mãe não iria querer me enganar, iludir. Ela me daria um verdadeiro PACote que fosse efetivo na resolução do problema, e que contivesse educação + liberdade + igualdade. Ela sabe que de nada me adianta ter educação pela metade, ou tê-la aprisionada pela falta de oportunidade, pela falta de escolha, acorrentada pela minha voz-nada-ativa. A minha mãe sabe que eu só vou crescer se a minha educação gerar liberdade e esta, por fim, igualdade. Uma segue a outra… Sem nenhuma contradição!

É disso que o Brasil precisa: mudanças estruturais, revolucionárias, que quebrem esse sistema-esquema social montado; mudanças que não sejam hipócritas, mudanças que transformem!

A mudança que nada muda é só mais uma contradição. Os governantes (às vezes) dão uns peixinhos, mas não ensinam a pescar. E a educação libertadora entra aí. O povo está tão paralisado pela ignorância que não sabe a que tem direito. Não aprendeu o que é ser cidadão.

Porém, ainda nos falta um fator fundamental para o alcance da igualdade: nossa participação efetiva; as mudanças dentro do corpo burocrático do Estado não modificam a estrutura. As classes média e alta – tão confortavelmente situadas na pirâmide social – terão que fazer mais do que reclamar (o que só serve mesmo para aliviar nossa culpa)… Mas estão elas preparadas para isso?

Eu acredito profundamente que só uma revolução estrutural, feita de dentro pra fora e que não exclua nada nem ninguém de seus efeitos, possa acabar com a pobreza e desigualdade no Brasil.
Afinal, de que serve um governo que não administra? De que serve uma mãe que não afaga? E, finalmente, de que serve um Homem que não se posiciona?

Talvez o sentido de nossa própria existência esteja ligado, justamente, a um posicionamento perante o mundo como um todo. Sem egoísmo. Cada um por todos…

Algumas perguntas, quando auto-indagadas, se tornam elucidativas. Pergunte-se: quero ser pobre no Brasil? Filho de uma mãe gentil ou de uma madrasta vil? Ser tratado como cidadão ou excluído? Como gente… Ou como bicho? “

Que não se esqueça o despertar do povo que engatinha no que se diz democracia. Relembro os movimentos de junho de 2013 que foram uma das mais importantes manifestações populares da história brasileira. Além disso, apresentaram um caráter absolutamente inédito. Não tiveram uma causa, como nas Diretas-Já e no impeachment de Collor. Não foram convocados por instituições representativas tradicionais, como partidos, sindicatos e grêmios estudantis. E surpreenderam porque não existia no horizonte nada que indicasse uma movimentação social tão intensa.

Que nós, todos os brasileiros de boa índole, não nos descuidemos de regar a semente plantada em junho de 2013. Um dever cidadão para com o Brasil.

Terra à vista

quinta-feira, 20 de abril de 2017






A dor da perda

Ontem, cansado e indisposto pela lida diária e seus problemas, sentia-me abstraído do mundo ao meu redor. Uma sensação de isolamento, onde nada importava. Foi quando, no andar da tarde, ao ir embora do Hospital São Vicente, ouço cortando o ar, como há muito não ouvia,  um choro alto, doído, um lamento repleto de tristeza sem fim. Em sobressalto saio da abstração que me consumia e localizo a figura de uma jovem mulata de corpo franzino, encostada na parede de um dos corredores do hospital, abraçada a alguém que lhe consolava em vão. Um pranto inconsolável. Era muita dor. Paro por alguns segundos e olho emudecido aquele lamento. Faço uma rápida leitura de minha vida. Como médico e como pessoa comum. A memória embaralha. Tento relembrar quantas vezes presenciei cenas assim e a conclusão que me vem é uma só: a dor da perda de alguém é a pior dor. Nada se compara. Em pensar que não se verá mais um sorriso daquele rosto, não se ouvirá mais uma frase solta no ar, não se sentirá mais o calor de um afago, não se terá mais a felicidade de um abraço, tudo isso destroça a alma. Ao sair pela Rua Anchieta vejo mais pessoas desta família chorando na mesma intensidade. Todos em desespero igual. Cena triste. Que alento clamar nessas horas? Parece que Deus se esqueceu de você. É o que todos nós dizemos. Olho mais uma vez para trás, vontade de abraçá-los também, mas tomo meu rumo. A tarde acabou para mim.

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Pra mim chega...


Sinceramente? Não ter como não ficar definitivamente desolado. Exemplos simples, um amontoado de absurdos que o homem vem praticando contra ele mesmo e que nos leva à descrença de qualquer futuro melhor do que a tragédia que vivenciamos hoje.

Estamos num ponto onde a razão foi totalmente deturpada. A emoção se tornou cega.

E pensar que a espécie humana, o ‘homo sapiens sapiens’, sendo o único ser racional entre todos os seres vivos ao longo da história da evolução, age de forma tão irracional, e que todas as outras espécies animais, ditas irracionais, se comportam com racionalidade, confirma-se um paradoxo difícil de engolir.

Um exemplo simples entre tantos que me vem cutucando a alma: nos esforçamos ao máximo para operar uma criança com doença cardíaca congênita, temos falta de vagas, falta de verba para atende-las, muitas morrem na fila e todo o sacrifício é pouco para dar vida a esta criança. E quando conseguimos, a felicidade torna-se a única companheira. Do outro lado do mundo, na Síria, vem um avião caríssimo, com um gás mortal caríssimo, e, sem qualquer preocupação maior de quem bolou o ataque, que não fosse o extermínio em massa, despeja esta arma mortífera sobre inocentes sadios, a maioria crianças, que queriam apenas viver sua vidas. Fica a pergunta: por quê? Por que muitos de nós nos esforçamos em ser solidários com o próximo e outros tantos tão cruéis? Que mundo é esse que vivemos? Por que tantas aberrações deste tipo? A irracionalidade do homem em nome do poder chegou ao seu limite. A dignidade em se ter segurança de viver racionalmente em harmonia acabou.

Quando o homem desrespeita a si próprio, na sua essência, não tem motivo mais para existir.

Pra mim chega.

Shut down...

sexta-feira, 31 de março de 2017






Arte do amigo Natanael Lomgo, o Nata

 

'Voa vida'


A dor incomoda. Qualquer tipo de dor. Sinto a mente jovem encarcerada dentro da velha armadura, que cada vez mais escancara a erosão do tempo. Meu corpo dói com o ranger das engrenagens. Não há como discordar: a vida é sábia, porém célere, e por vezes demoramos a nos dar conta que tudo é passageiro, menos o motorista e o cobrador.

O incomodo constatar que “la nave vá” nos faz buscar lenitivos por dias melhores. O cérebro pede asas para voar; já o corpo pede uma sombra para recostar o dorso exausto. Que triste antagonismo.
Guiado pelo instinto da sobrevivência passei a perseguir pegadas de passos cada vez mais rápidos a minha frente que alimentassem o fôlego de viver melhor. Assim já a bom tempo corro devagar – quase todos os dias - com a pressa de quem nunca teve pressa.
 

Mas a toda nova atitude sempre existe a sombra do imponderável, artimanhas do destino que te seduzem a desafiá-lo, e ele, sábio e inflexível, te induz ao erro. Acelerei sem poder acelerar. Duas quedas dominicais inesperadas, em sequência, fora do cardápio do manual da boa saúde – parece até mandinga encomendada – e já a três domingos me posto sentado vendo a banda passar.
A dor no ombro direito lesionado é lancinante. Cirurgia talvez. Como seria bom se toda vez que tomássemos uma atitude errada ou mal intencionada, o cérebro doesse como dói minha junta, alertando para o perigo do movimento proibido. A lesão na alavanca do braço direito, aquele que levanta a espada, tolhe momentaneamente o ato guerreiro. Mas nada na vida acontece por acaso. Existem momentos na boa guerra onde é prudente recuar, se aquietar e escutar o que diz o sussurro do vento. Olhar ao redor e buscar esperançoso, no horizonte da manhã que se descortina, o primeiro raio de sol.


Brincando com minhas duas netas, que ignoram o dodói do vovô, olho em oração para os ventres de minhas filhas. Lá estão guardados minha nova princesa e os dois guerreiros que virão ao mundo para dar seqüência às gerações que se sucedem. Em breve um quinteto angelical que peço à luz divina- todos os dias- que os proteja e abençoe. Terão suas vidas, terão seus arbítrios, mas por hora é nossa missão cantar as cantigas de ninar que os acalmam e os fazem adormecer em paz.


Repentinamente me vejo só na sala. Olho meu toca discos que a tempo não faz girar seu prato. Na prateleira encontro o LP de 1982 “Voa a vida” do Sergio Sá. Cheira a guardado e me faz viajar aos meus 30 anos. Entorpecido ouço os versos finais da canção “Represa” que diz: ‘E assim vou enfrentando toda loucura de ainda não me conhecer. Minhas revoltas, meus fracassos, minhas dúvidas. As ventanias, o sol quente, os temporais. Mas vale viver pela luta da correnteza, vale viver contra o maciço da represa... ’
 

Momento sem espaço para a dor. Vida leve, vida breve. (artigo publicado há exato 1 ano, que o Picôco adorou e ligou pra comentar num papo longo e gostoso).

quinta-feira, 30 de março de 2017


Foto: João Ballas

Qual o enredo, Picôco?


(Texto que publiquei em março de 2016 onde citava o amigo, hábito de gentileza comum em nossas escritas. A intuição matreira, inconscientemente, já se manifestava nos encontros com o Picôco. Uma de muitas lembranças de pessoa tão querida)

# Qual o enredo?
Não existe coisa pior do que quando nossas vidas se expõem em aflição. A doença é a pior delas. Agora a pior aflição é sofrer junto. É difícil conviver com a angústia estampada nos olhos de quem sofre. Causa-nos certo imobilismo difícil de descrever.

São peças de última hora, onde não se é ator do elenco, mas por necessidade da trama envolver gente querida, você pula de cabeça no roteiro com a finalidade de auxiliar para que ele transcorra da melhor forma, sem incidentes e aplausos no final.

Você, coadjuvante de última hora, se solidariza às últimas conseqüências vivendo o enredo como se autor, roteirista e diretor fosse deste drama pontilhado de realidade perversa. Seu bom astral tem que elevar o espírito da tropa mesmo sofrendo calado, torcendo para que tudo termine bem e logo. A vida tem que ser comédia senão perde a graça.

Antes tudo em nossas vidas fosse só mais uma peça de teatro com o impacto da emoção cronometrado com começo, meio e fim, onde você pode opinar se gostou ou não, ou mesmo levantar e ir embora se o espetáculo não te agrada. Já com a vida não é assim: é marota, leve, mas traiçoeira. O enredo de todos os enredos.

Ando apreensivo, em especial quando envolve amigos adoentados onde atuamos muito mais como amigos de fé do que como profissional. As palavras cismam em fugir da lógica. Pensamentos que gostaria de passar para o papel, meus dedos não obedecem. Em momentos assim desisto de mim. Busco lenitivo apaziguador, conforto à alma, breve trégua, relembrando o sincero “Vida” (A.Henfil) que o amigo Picôco tanto exalta:

"Por muito tempo pensei que a minha vida fosse se tornar uma vida de verdade. Mas sempre havia um obstáculo no caminho, algo a ser ultrapassado antes de começar a viver. Um trabalho não terminado, uma conta a ser paga. Aí sim, a vida de verdade começaria. Por fim, cheguei a conclusão de que esses obstáculos eram a minha vida de verdade.

Essa perspectiva tem me ajudado a ver que não existe um caminho para a felicidade.

A felicidade é o caminho. Assim, aproveite todos os momentos que você tem. E aproveite-os mais se você tem alguém especial para compartilhar, especial o suficiente para passar seu
tempo, e lembre-se que o tempo não espera ninguém.

Portanto, pare de esperar até que você termine a faculdade; até que você volte para a faculdade; até que você perca 5 quilos; até que você ganhe 5 quilos; até que você tenha tido filhos; até que seus filhos tenham saído de casa; até que você se case; até que você se divorcie; até sexta à noite; até segunda de manhã; até que você tenha comprado um carro ou uma casa nova; até que seu carro ou sua casa tenham sido pagos; até o próximo verão, outono, inverno; até que você esteja aposentado; até que a sua música toque; até que você tenha terminado seu drink; até que você esteja sóbrio de novo; até que você morra...

E decida que não há hora melhor para ser feliz do que agora mesmo.

Lembre-se: felicidade é uma viagem, não um destino. Viva a vida!“

Que a viagem honre seu traçado aos que tanto merecem viver e a fé em acreditar.

domingo, 26 de março de 2017





Por um instante...


Com Camões me acalmo: “Cesse tudo o que a Musa antiga canta / Que outro valor mais alto se alevanta”? Ora, pois. Paro e não olho para o lado. Nada mais me chamará a atenção que este momento. Ficar órfão de uma alma que não é só sua? Valores que perdem seu valor ante a possibilidade do inusitado?

Não é só o bem querer que se está em jogo; ou o apego; ou a dependência; ou o carinho; ou o desejo; ou a alegria; ou algo que nem sei bem como explicar. É um sentimento miscigenado, de muitos matizes, espectro que nem o mais ilustre poeta descreveria, nem o mais talentoso pintor apontaria em tela.

Nada é relevante quando a ameaça ronda e o que transtorna é a possibilidade do vazio. Do vácuo etéreo que o momento cria e te amedronta.

O tempo é linear, sem medida, sem dimensão, mas fatia-se por conveniência. Juntos há 44 anos, nossa interdependência não tem qualquer critério que possa avaliá-lo com exatidão. Sentimento difícil de explicar.

A carta encoberta lançada sobre a mesa pode acabar com nosso jogo. Mas nosso “sei lá o quê”, que tanto nos une, banca a aposta. A frase: ‘-Caso não volte, prometa que será feliz!’ ecoa em minhas entranhas como mantra soturno, e a solidão de estar só onde quer que esteja termina quando o jovem especialista tranquiliza: “- A cirurgia transcorreu como esperado. Ela está bem”.

Nesta hora não sou nada. Sou só aquele que morre aos poucos  com a ausência do par. Seus olhos entreabertos ainda narcotizados tremulam para lá e para cá em busca dos meus que só podem lhe oferecer duas lágrimas.Homem que é homem não chora? Arrisco um sorriso tímido que, ao vê-la sorrir, aos poucos se alevanta desabrochando a alma prisioneira. Abro as janelas da angústia e deixo o sol entrar.

Em nome da Maria Eugenia e de toda minha família agradeço o talentoso ortopedista Dr. Eduardo Gomes Machado e sua equipe, o brilhante anestesista Dr. Douglas Humberto Lovatti, o Hospital UNIMED e toda sua robusta estrutura hospitalar (em especial ao seu corpo de funcionários de todos os setores, gente digna e prestativa) pelo atendimento oferecido na internação da cirurgia de minha mulher.


E por último uma frase pequenina que de seu valor mais alto se alevanta: “- Gê... Obrigado por existir.”

terça-feira, 7 de março de 2017




O resto é resto

Sou médico e agora estou vereador. Sem dúvida minha vida mudou e está difícil se adaptar a esta nova fase. O envelhecer, ao mesmo tempo em que te priva de inúmeros movimentos que as juntas faziam e hoje tanto doem, na mesma medida, nos privilegia a mente, nosso raciocínio, depura nossas ideias, isto se o alemão não incomodar. Entretanto, antes disso, muito podemos fazer. O benefício do passar dos anos. Digo-lhes que a experiência de ser avô é a diplomação de nossa maturidade enquanto vida.

Nossos filhos são criados com amor e carinho, porém, é na figura de nossos netos é que vemos a purificação do bem querer. Oferecemos a eles a experiência e a compreensão que a vida nos proporcionou de maneira cálida e pacienciosa. Com todo o cuidado.


O idoso é realista, imediatista e idealista. Eu sou assim e é assim que quero minha cidade: exemplar. Pelo tempo curto que me resta quero decisões para ontem e é por isso que, por vezes, me vejo angustiado. Minha vida já era atribulada o suficiente e fui arranjar mais essa. Tenho tido alergia nervosa, insônia, arritmia devido ao estresse político. Mas quem inventou? "Você, é claro", dá a sentença minha mulher.


Dúvidas, incertezas, vaidades, tudo isso também tem colaborado com a atual situação, mas tranquilizo a todos: sou contra reeleição para um mesmo cargo político. É foro particular e não tenho absolutamente nada com quem pense o contrário. Portanto quero ser vereador uma única vez, exemplar na medida em que me cabe. Por isso peço para que vejam minhas atitudes, de louvor sincero ou crítica áspera, visando somente o bem comum para a cidade. Só isso. 


 Perguntam-me: como é ser vereador? Confesso ser uma missão difícil na medida em que você se conscientiza da real importância junto àqueles a quem você representa. Já expus inúmeras vezes que sou um municipalista de carteirinha. Quero minha cidade em ordem para que ela sirva de exemplo às outras e que esta onda centrípeta do bem se propague a todo Brasil. Aí sim teríamos um país melhor.


Jundiaí tem que ser exemplo. E como se consegue isso? Com boa política. Com política séria e honesta, enfim, política de compromisso efetivo. Algo real e não de retórica apenas. De discursos bonitos a grande maioria dos brasileiros nos dias de hoje já está cheio. O descrédito político atualmente é conversa de qualquer ambiente. Na rua, na fila de ônibus, no bar, no barbeiro, enfim, em qualquer lugar. Como disse o imexível senador Romero Jucá, um safardana de quinta categoria: “a suruba tem que ser pra todos!”. O brasileiro acordou de um sono profundo de inércia e apatia e é por isso que nós, os compromissados com a cidadania e com a outorga de vereador ou qualquer cargo eletivo, temos a obrigação de honrarmos as calças que vestimos e por pra correr meliantes como o tal senador Jucá e tantos outros de sua laia.


Nas câmaras municipais - e aqui não é diferente - existem inúmeras opiniões e posições diferentes. Todos são eleitos da mesma forma e isso significa independência de atitude e ideologia. Chancela a individualidade democrática, mas na nossa democracia as coisas são um pouco diferentes.
 


Um exemplo é a base parlamentar de apoio ao Executivo que, com sua ampla maioria, sempre decidirá a favor do que por bem entender a parceria. Confio que estas atitudes sempre serão pautadas pela correção, bom senso e ética, entretanto, reservo-me o direito de discordar do que não julgar correto. Que tal atitude sempre seja compreendida e respeitada e não julgada de outra forma. Caça as bruxas já foi seu tempo. O primeiro teste que vivi foi traumático. Agora observo quieto para dar o bote certeiro, já vacinado.
A minha individualidade termina onde inicia a de outrem. A democracia entre todas as formas de governo ainda é o regime menos ruim. Considero-me um social democrata, isto para desagrado do Trump. E se preciso for vou lá falar com ele também, como fiz com o Ministro da Saúde. Pagando minhas despesas, é claro!


Perguntam-me com relativa freqüência: você é oposição ou situação. Respondo de forma simples: sou Jundiaí. Qualquer projeto que venha para avaliação, tanto do legislativo como do executivo, se entender que é bom para nossa cidade terá o meu sim. Caso contrário o meu não. Simples assim.


Tenho 64 anos. Nesta altura da vida lhes digo que as decisões que tomo são baseadas em prioridades que o bom senso determina. Aqui cabe o exemplo de ter ido a Brasília na terça feira, dia 7 de fevereiro, primeira sessão da casa. Quem não aprovou paciência.


Perguntei à deputada Pollyana Gama (do meu partido, o PPS), que me inclui na audiência, se daria para ir em outra oportunidade, ao que ela disse: tem mais de 5.000 cidades querendo falar com o ministro e nós já estamos lá. Você decide! Não hesitei em aceitar. Era necessário. Fui com o aval do prefeito Luiz Fernando e a presidência da Casa, Gustavo Martinelli. Uma missão importante por nossa cidade conhecendo as agruras atuais que a afeta. Viajei com recursos próprios, exceto ir para aeroporto.


Nossa cidade tem direito a três verbas federais já aprovadas. Só falta assinar e publicar no Diário Oficial da União e as três têm direito a quase 38 milhões de reais/ano de repasse. Adequar custos do município à gestão da saúde é necessário é verdade, mas a esperança em buscar recursos no estado com o governador e em Brasília com o ministério tem que ser tentado todos os dias. Sem cessar. É direito da cidade e é o que estamos fazendo. A atenção à saúde em cidade do porte de Jundiaí tem que ser otimizada a toque de caixa.
Que fique bem claro: ter ido lá não significa que voltei com o dinheiro no bolso, mas sim que eles estão nos devendo e fui lá cobrar e vou continuar cobrando. Que fique bem claro que não costumo perder dia de trabalho à toa, mas por Jundiaí valeu o esforço.


O nosso São Vicente é um velhinho doente, porém, vigoroso e é quem sempre a tudo resolve. Tem que ser olhado e tratado com carinho. É o mínimo. Seu desempenho, indicadores e qualificação são exemplares. Temos deficiências? Claro que sim. Um sem número delas, mas ao final o saldo é sempre positivo. Somos um resolutivo hospital-escola e nossos alunos e residentes atestam isso com seu treinamento. Meu grupo de cirurgia cardíaca e hemodinâmica, por exemplo, é referendado pelo DATASUS do Ministério da Saúde como o segundo melhor serviço do interior do estado de São Paulo em resultado e satisfação. E isto muito me orgulha ao ter completado em 2016 quarenta anos de formatura como profissional da área médica. E orgulho maior foi ter estudado na Faculdade de Medicina de Jundiaí, trazido pelas mãos do ilustre jundiaiense Dr. Jayme Rodrigues.


Convivemos com o pessimismo diário que a Prefeitura foi encontrada com um déficit financeiro enorme. Ok. Mas que fique claro: se estiver faltando dinheiro no caixa, nós, o povo que trabalha e paga impostos, não temos culpa pelo que aconteceu. Vamos, então, apoiar atitudes que ajudem a reparar o ocorrido. Que se denuncie no Ministério Público e onde mais for necessário. É obrigação de quem está no comando. Se houve farra com nosso dinheiro, se houve benefício particular, se houve favorecimentos, se desviaram ou se gastaram mal o que tinha no cofre, que se vá atrás, que se investigue a fundo os envolvidos, e, se culpados forem, que se tente repatriar o dinheiro desviado. Todos agradecerão. Quando se quer consegue, esta aí a Lava Jato pra provar.


Que o Brasil está carunchado desde quando Cabral chegou todos sabemos. Que o poder fascina e é o "sexo dos velhos" que se embrenham e se acomodam na política por toda avida, geração pós geração, também sabemos. Por isso chegou a hora da “fratura exposta”, como bem diz o músico Lenine. Chega de palhaçada conosco. Confio em minha família, nosso núcleo maior. Confio em mim. Confio nas pessoas de bem.
Que sejamos todos por uma Jundiaí melhor. Por um país maior.
Coragem, consciência, determinação e honestidade são os caminhos a seguir. O resto é resto.


segunda-feira, 6 de março de 2017

 

 

É piada ou é deboche?


Muita gente já discutiu, escreveu-se a exaustão, entrevistas e vídeos "abundam" nas redes sociais, todas versando sobre o odor insuportável que não cessa e paira no ar após a Lava Jato ter destampado as comportas da rede de esgoto da política brasileira.

Muito burburinho com a corrupção sistêmica desfraldada, com alguns figurões da política, ora sem foro privilegiado, lobistas, donos de empreiteira e seus asseclas, presos, entretanto ainda se tem uma quantidade enorme de nobres parlamentares, com seus colarinhos brancos, gravatas italianas com nó Windsor e sorriso de canto de boca, denunciados até a alma por rapinagem graúda, fazendo pouco da justiça, zombando e desafiando a lei, com o famoso “a mim ninguém pega”. É a esculhambação nacional elevada a potencia do ridículo.

Desculpe-me presidente Temer. Até pensei que dava pra ter um fiapo de esperança em vossa senhoria no pós-Dilma, mas, infelizmente, tu és parte daquele ditado antigo: “diz-me com quem andas que direi quem és”.

Cacete! Vossa senhoria não se toca ?! Quantos homens de sua confiança já foram pegos com a mão na massa? Massa podre, é claro. Tinha agora que indicar o tal Romero Jucá para líder do governo no Senado, um dos últimos dos moicanos da sua tribo?! Um senador pela longínqua e pujante Roraima com pele de salamandra, sempre moldado a cor de quem está no poder. Já foi de tudo um pouco desde a ditadura militar, atravessando garboso os governos Figueiredo, Sarney, Itamar, FHC, Lula, Dilma e agora no seu – sempre deliciando-se com o poder na base do malandro do bom papo e da mão leve. Jucá , caro presidente, é o “Caju” para Claudio Melo Filho, o ex-lobista da Odebrecht que o cita 105 vezes na sua delação. Em 82 páginas, Melo Filho conta quantas e quais vezes Jucá trabalhou para aprovar medidas provisórias de interesse da empreiteira e cobrou por isso em moeda sonante.Mas não vem ao caso, não é mesmo?

O Jucá , seu líder, caro presidente, é o mesmo que soltou a pérola dias atrás, ante o risco de se restringir o foro de políticos somente para crimes cometidos no exercício do mandato eletivo: “Se acabar o foro, é para todo mundo. Suruba é suruba. Aí é todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada”.Impressionante!
Agora se entende presidente porque ao nomear Jucá seu líder de governo, a pesquisa aponta seu total descrédito junto ao povo. Porque faz Lula, o eterno inocente, aparecer bem nas pesquisas para 2018.

Pode? Não o incomoda relevar denúncias contra políticos do seu PMDB na Lava Jato ou qualquer outra investigação, apesar da enorme quantidade de provas produzidas? Elas não constituem constrangimento, nem mesmo um desconforto a vossa senhoria? Uma pena, pois sua postura acadêmica até que impressiona.Não tanto quanto de sua esposa, mas impressiona.

Após analisar o ridículo discurso do seu senador dia desses no plenário do Senado, quando afirmou: "Está parecendo que estamos vivendo o período da inquisição, ou a Revolução Francesa. Estão querendo pregar em todos nós a estrela de Israel no peito, como os nazistas pregaram nos judeus que viviam na Alemanha. No passado, a turba fazia linchamentos, hoje quem tenta fazer é a imprensa e setores da sociedade", aí bem colocou ironicamente o âncora Boechat da Band News: "Seu caso, senador, não é de perseguição não. É ladroagem mesmo. E praticada num quarto escuro de uma tresloucada suruba!"

Gosto de acreditar nas pessoas, mas debochar da nossa cara não, presidente. O Brasil não merece. Já deu!